“O PERDÃO QUE LIBERTA”
(Mateus 18.21-35)
Sermão preparado para
a PIB Linhares, em 14/01/16, quinta-feira, noite.
Boa noite irmãos.
Nesta noite eu gostaria de
refletir sobre um dos temas cristãos mais difíceis para se colocar em prática:
O Perdão!
Colocar o ensino de Jesus
sobre o perdão em prática é humanamente tão complexo, que os apóstolos pediram
que Jesus lhes aumentasse a fé.
Interessante, não?! Jesus
disse aos doze que pregassem o evangelho por todo o mundo; que eles sofreriam
por isso; que seriam perseguidos e até mortos; e eles não pediram nada a Jesus para passar por essas situações;
mas quando Ele lhes ensinou sobre o perdão eles disseram (Lucas 17.5): “Aumenta a nossa fé”
Então esta noite também vai
ser um exercício de expansão da fé, porque humanamente falando é impossível
compreender o perdão, nos moldes em que Jesus ensinou.
A mente humana, a
racionalidade humana, o pecado humano, não permite compreender o princípio do
perdão; só pela fé isso é possível.
E para isso, eu peço que você
abra a sua Bíblia no Evangelho segundo Mateus, capítulo 18, versos 21-35:
“21.(...).” (Mateus 18.21-35).
O perdão que liberta!
Vamos orar mais uma vez.
O primeiro ensino sobre o
Perdão que liberta, é que...
1) DEUS É O PRINCÍPIO DO PERDÃO (v. 27).
“27. Comovido, o senhor daquele servo soltou-o, e perdoou-lhe a dívida.” (Mt 18.27).
O ensino de Jesus sobre o
perdão começa com uma fala de Pedro. Ele, como sempre, o mais ousado dos
apóstolos, perguntou a Jesus (verso 21):
“21. Então Pedro, aproximando-se dele, perguntou-lhe: Senhor, até quantas vezes deverei perdoar
meu irmão que pecar contra mim? Até
sete vezes?” (Mt 18.21).
Parece que Pedro estava diminuindo
o ensino sobre o perdão: -Perdoar só sete vezes, fala sério né Pedro?
Mas na verdade quando Pedro
pergunta a Jesus se ele deveria perdoar até sete vezes ele estava indo muito
além do que era ensinado aos Judeus.
Para um judeu a regra geral
era a Lei de Talião (Ex 21.23-25):
“23. mas, se causar dano, então pagarás vida por vida,
24. olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por
pé,
25. queimadura por queimadura, ferimento por ferimento,
golpe por golpe.” (Ex 21.23-25).
É a regra do “bateu-levou”.
Mas, em razão da
manifestação do perdão de Deus, os judeus desenvolveram a sua doutrina sobre o
perdão, de que era lícito perdoar até
três vezes, mas esse era o limite do perdão.
Eles basearam essa doutrina
nos textos de Jó 22.28-29: “28. Mas Deus livrou a minha alma da cova, e
a minha vida verá a luz. 29. Tudo isso Deus faz duas e três vezes ao homem.”
E, ainda, no texto do
Profeta Amós, capítulo 2, verso 1º: “1. Assim diz o Senhor: Pelas três
transgressões de Moabe; sim, e pela quarta, não retirarei o castigo; pois
queimou os osso do rei de Edom até reduzi-los a cinzas.”
Então quando Pedro pergunta
a Jesus se deveria perdoar até sete vezes, na mente de Pedro ele estava sendo
muito generoso com o seu ofensor. De três vezes para sete, é o dobro e mais uma
vez. Show de bola.
Então Jesus diz que o perdão
deve ser setenta vezes sete. E conta uma parábola para ilustrar como devemos
perdoar as pessoas.
A parábola começa com um rei
que decidiu acertar contas
com seus servos.
O
rei é a figura de Deus. Todos os seres humanos vão ter que lhe
prestar contas, não há como escapar desse ajuste, mas nossa grande confiança é
a disposição de Deus em nos perdoar quando nosso coração se arrepende
genuinamente.
E Jesus diz que o rei perdoa
o seu servo em uma dívida de dez mil talentos O equivalente a sessenta milhões
de denários). O denário equivalia a um dia de trabalho.
Para termos uma ideia, ainda
que bem grosseira, de quanto era o valor, podemos pegar um dia do trabalho de
um brasileiro (com base no salário mínimo, basta dividir R$ 880,00 por trinta
dias), que é R$ 29,33. Multiplicando isso por 60 milhões, a dívida do homem era
algo aproximado a R$ 1.759.800,00
(um bilhão, setecentos e cinquenta e nove milhões e oitocentos mil reais), e
esta dívida em um país que remunera mal os trabalhadores, se fosse na
Austrália, que tem o maior salário mínimo do mundo a dívida seria muito maior
(Mínimo mensal R$ 6.136,00, com o dólar a quatro reais – a dívida seria de 12 bilhões de reais).
O rei talvez até tivesse
essa quantia, mas um de seus servos não teria. Com isso Jesus queria mostrar na
parábola que a dívida daquele homem era impagável.
Nossa dívida com Deus também
é impagável. Não há bondade, não há boas obras, não há velas suficientes para
serem queimadas, ou caridade suficiente, que possa quitar nosso débito com
Deus.
Por isso o perdão de Deus é
baseado na sua própria graça. “Efésios 2.8: Porque pela graça sois salvos,
por meio da fé, e isto não vem de vós, é dom de Deus”.
Este
é o modelo de perdão de Deus. Infinito, imensurável, como o amor de Deus por
nós. Basta arrependimento e fé (coisas internas, não externas).
Esse é o tipo de perdão que
Jesus estabelece como padrão os seus discípulos.
Por isso o segundo ensino
sobre o Perdão que liberta é que...
2) PRECISAMOS APLICAR O PRINCÍPIO DO PERDÃO DO SENHOR AOS NOSSOS
OFENSORES (v. 28-30).
“28. Ao sair, porém, aquele servo encontrou um dos seus
conservos , que lhe devia cem denários; agarrando-o, sufocava-o, dizendo: Paga
o que me deves.
29. Então, caindo aos seus pés, o seu companheiro lhe
suplicava: Tem paciência comigo, te pagarei.
30. Ele, porém, não quis; antes mandou colocá-lo na
prisão, até que pagasse a dívida.” (Mt 18.28-30).
Nesta parte da parábola
Jesus se dedica aos relacionamentos humanos.
Como nós somos pródigos
quando queremos o perdão de Deus: –Senhor, eu fiz isso, fiz aquilo, mas o
Senhor sabe que eu erro, sou humano, o Senhor sonda o meu coração, me perdoa.
Essa fala é nossa quando
pedimos o perdão de Deus, e se houver arrependimento sincero Deus vai perdoar.
Essa fala é quando Deus é o
ofendido (quando pecamos Deus sempre é o ofendido).
Mas
e quando somos nós os ofendidos?
É aqui que as coisas se
complicam. Nós temos muita dificuldade em perdoar as ofensas que nós sofremos.
Em grande número de vezes,
nossa primeira reação é fazer como Pedro, decepar a orelha do adversário.
Ou então a gente faz
diferente. Diz que perdoou (-há, eu já perdoei, sabe), mas fica
relembrando com mágoa a ofensa ao longo dos anos.
Isso acontece porque nós
esquecemos quem somos. Esquecemos o que Deus fez conosco.
O
nosso pecado é uma formiga aos nossos olhos. Há sempre uma desculpa, um
atenuante, uma justificativa.
Os
pecados dos outros é um elefante. Não tem desculpa, não tem justificativa, não
tem compreensão, e muitas vezes não tem o nosso perdão.
Mas quando olhamos para
Deus, para o perdão que recebemos, para a dívida impagável que Deus perdoou, o
que é o erro do nosso próximo contra nós?
Não é nada.
Lembra, que eu calculei a
dívida do primeiro servo de 60 milhões de denários em quase 2 bilhões de
reais?! A dívida do conservo, o que foi para a cadeira, era de apenas cem
denários, que daria hoje aproximadamente R$ 2.933,00 reais.
É como se nós fossemos ao
banco, com uma dívida de 2 bilhões de reais, o Presidente do Banco nos
perdoasse (vai, a sua dívida está paga), e ao sair do banco, na esquina da rua,
engarguelássemos um outro correntista do banco, porque ele me deve três mil
reais.
Um absurdo, alguém que foi
perdoado em R$ 2 bilhões, mandando alguém para a cadeia por R$ 3.000,00.
Nós olharíamos uma situação
dessas com profundo desprezo pela ganância, pela maldade, pela insensibilidade
daquele homem. É dessa forma que Deus vai olhar para mim e para você quando nós
deixamos de perdoar as pessoas que nos ofendem.
Mas
e o meu orgulho, e a minha dignidade, a minha honra?
E
a dignidade, a honra e a glória de Deus, é menor ou maior que a nossa?
Não há como dizer quão
infinitamente superior é a honra do nome do Senhor! Mas mesmo assim ele é capaz
de perdoar as nossas ofensas contra ele, por isso Jesus morreu por nós naquela
cruz do calvário.
Quem sou eu para negar o
perdão a outra pessoa, quando Deus não negou o seu perdão a mim?
Nesta noite eu não sei se há
alguém aqui que guarda mágoa, rancor, ou tristeza no coração, por uma ofensa
que sofreu.
Eu não estou dizendo que
você não foi ofendido; eu não estou dizendo que você não tenha sofrido com
isso, e eu não estou dizendo que o seu ofensor não esteja errado. Mas o que
Jesus nos diz, e eu preciso repetir isso, é que você deve perdoar essa pessoa,
porque em primeiro lugar você foi perdoado por uma dívida infinitamente maior
que a ofensa que você mesmo sofreu.
Deus me perdoou, eu não
tenho o direito de não perdoar outra pessoa, seja qual for a ofensa que eu
sofri.
E Deus me manda fazer isso
para o meu próprio bem.
Esta é a terceira e última
observação desta noite.
3) O PERDÃO NOS LIBERTA (v. 33-35).
“33. Tu também não devias ter compaixão do teu
companheiro, assim como tive de ti?
34. E, irado, entregou-o aos carrascos, até que ele
pagasse tudo o que lhe devia.
35. Assim também vos fará meu Pai celestial, se cada um
de vós não perdoar de coração ao seu irmão.” (Mt 18.33-35).
Na parábola contada por
Jesus o rei entregou o servo sem compaixão para ser torturado pelos carrascos,
até que pagasse a dívida.
Uma coisa a ser esclarecida é
que Jesus não está falando que perdemos a salvação se não perdoarmos as
pessoas. O ensino aqui não é sobre salvação, mas sobre perdão.
Mas Jesus disse que aquele
que não perdoa é também entregue aos “carrascos” pelo Pai Celestial.
De
que “carrascos” Jesus estava falando? O que é que pode nos “torturar” enquanto
não perdoamos aquele que nos ofendeu?
É simples. Como você se
sente quando lembra de uma ofensa que ainda não perdoou?
Você fica feliz? “-nossa,
aquele mulher falou mal de mim no trabalho, inventou um monte de mentiras para
minha supervisora, que alegria, estou felicíssimo com isso!”
Você sente paz? “-aquele
sujeito me chamou de fracassado, eu estou sentido uma paz invadir meu coração
por isso!”
Ninguém que não tenha
perdoado seu ofensor vai sentir paz ou contentamento. O sentimento de quem não
perdoou sempre vai ser de mágoa, rancor, raiva, tristeza, dor.
Vocês acham que existe um
carrasco pior que esse? Toda vez que se lembrar da ofensa, voltar a sentir os
mesmos sentimentos do momento em que ela aconteceu, toda a dor, frustração,
raiva.
Eu acho que não.
Por
isso somente quem perdoa é livre. Aquele que não perdoa é
como se estivesse algemado àquela situação, como alguém algemado a um cadáver.
Para onde vai o defunto está
ali: malcheiroso, desagradável, incômodo, pesado, prendendo você, e arrastando aquela situação pela vida
afora.
É como uma ferida que não
cicatriza, que volta a doer toda vez que você mexe nela.
Por isso Jesus mandou aos
seus discípulos que perdoassem todas as vezes que fossem ofendidos.
Jesus não deseja que nós
fiquemos presos a uma situação que só vai nos fazer mal, enquanto estivermos
nesta vida, tirando a alegria da nossa salvação, do perdão que nós recebemos
pela dívida que tínhamos com Deus antes de Ele nos perdoar, quando entregamos
nossas vidas a Jesus.
Ninguém vai tirar a alegria
da salvação que Deus me deu enquanto eu perdoar os meus ofensores.
Jesus ensinou isso para que
tivéssemos vida e vida em abundância, como diz o texto de João 10.10.
Há um exemplo de pessoas que
escolheram o caminho do perdão e não da vingança na África do Sul.
No período de 1910 a 1994 a
minoria branca governou aquele pais oprimindo a maioria composta por negros.
Os mais jovens talvez não
conheçam a expressão “apartheid” (apartáid), que significa
“separação”.
Imagine uma país onde uma pessoa não pode comprar terras,
votar, frequentar determinados locais públicos, nem receber o mesmo tipo de
serviço público que o resto da população, nem mesmo se casar com uma pessoa
branca, só porque é negro.
Ver seus filhos sofrendo, sem escolas, saúde; sem
oportunidades, só porque são negros.
Para um homem negro que estuprasse uma branca a pena era a
morte. Para um branco que estuprasse uma negra a pena máxima era uma multa,
isso quando ocorria.
Isso certamente suscitaria muita raiva, muito rancor. Como
perdoar os policiais que mataram uma esposa, ou um marido, ou um filho em um
regime tão perverso como esse?
Como seria possível perdoar alguém
que tivesse tirado a vida daqueles que amamos?
Mas foi esse tipo de perdão que a África do Sul experimentou
depois de 1994, quando Nelson Mandela foi eleito presidente pelo voto livre.
Após ser
eleito presidente da África do Sul e depois de 27 anos de prisão, convidou seu
carcereiro a juntar-se a ele no palanque da posse. Então convidou o arcebispo
Desmond Tutu para chefiar uma equipe do governo chamada: Comissão da Verdade e
Reconciliação – CVR.
Durante os
dois anos e meio seguintes, os sul-africanos ouviram relatos de atrocidades
chegando às audiências da Comissão da Verdade e Reconciliação. As Regras eram
simples: Se um policial, ou oficial do
exército, branco, enfrentasse voluntariamente seus acusadores, confessasse seu
crime e reconhecesse totalmente a culpa, poderia não ser julgado e punido por
aquele crime. Partidários de procedimentos mais duros reclamaram da evidente
injustiça de deixar criminosos sair livres, mas Mandela insistiu que o país
precisava muito mais de restauração que de justiça.
Em uma
audiência, um policial chamado Van de Broek relatou um incidente no qual ele e
outros policiais fuzilaram um garoto de 18 anos de idade e incendiaram o corpo,
virando-o sobre o fogo como um pedaço de churrasco a fim de destruir qualquer
evidência. Oito anos mais tarde, Van de Broek, voltou à mesma casa e capturou o
pai do rapaz. A esposa foi forçada a assistir a tudo, enquanto policiais
amarravam seu marido a uma pilha de madeira, jogavam gasolina em seu corpo e
ateavam fogo.
A sala do
tribunal ficou em absoluto silêncio quando a mulher, já idosa, que perdera o
primeiro filho e depois o marido, teve a oportunidade de responder.
O juiz
perguntou: “O que a senhora deseja do
sr. Van de Broek?”. Ela disse que queria que Van de Broek fosse ao
lugar onde tinha queimado o marido dela e reunisse suas cinzas, de modo que ela
pudesse lhe dar um funeral decente. Cabisbaixo, o policial balançou a cabeça
concordando.
Ela então
fez um pedido adicional: “O sr. Van
de Broek tirou minha família inteira, mas ainda tenho muito amor para dar. Duas
vezes por mês, gostaria que ele viesse ao gueto e passasse um dia comigo, a fim
de que eu possa ser uma mãe para ele. E gostaria que o sr. Van de Broek
soubesse que foi perdoado por Deus, e que também lhe perdoo. Eu gostaria de
abraça-lo para que ele soubesse que meu perdão é verdadeiro”.
Naquele
instante algumas pessoas na sala do tribunal começaram a cantar “Amazing grace”
(Maravilhosa Graça), enquanto aquela senhora se dirigia até o local das
testemunhas, mas Van de Broek não conseguiu ouvir o hino. Havia desmaiado,
pasmo com o que acontecera.
Aquela
mulher ficou livre quando perdoou aquele homem que lhe tinha causado tanta dor
e sofrimento.
O apóstolo Paulo,
ao escrever a Carta aos Romanos disse (Rm 12.21): “21. Não te deixes vencer pelo mal, mas vença o mal com o bem.”
CONCLUSÃO:
Nesta noite talvez o seu
coração guarde mágoa, tristeza, talvez até ódio de alguém que tenha te ferido.
E se você ainda pensa na
situação e tem esses sentimentos (tristeza, mágoa), se ainda dói quando você pensa, é preciso que você perdoe essa
pessoa, para que você se liberte desses “carrascos” que te torturam, e possa
experimentar a paz e a alegria que Jesus pode dar.
Isso é vencer o mau com o
bem!
Quando perdoamos nós mesmos
somos libertos. É difícil perdoar, é, mas é possível, pela fé. Por isso os
apóstolos pediram a Jesus “aumenta a nossa fé” (Lucas 17.5).
Eu quero orar neste momento
para que Deus nos ajude a perdoar, com o mesmo perdão que recebemos do Senhor,
pela graça que recebemos.
Linhares, 13 de janeiro de
2016.
Pr.
Marcos José Milagre
PIB
Linhares